Em
meu primeiro contato com o computador tive a impressão que aquela
máquina parecia o Deus do Velho Testamento: ele ditava uma porção
de regras e não tinha nenhuma clemência. Não faz muito tempo. As
telas eram basicamente televisores pesados e os teclados
monstruosidades cujos comandos eram combinações herméticas como
rituais de magia. Haviam os "xamãs da computação", como
era o caso do meu brilhante amigo Marco Aurélio. Ele era nosso
mestre pq conhecia os signos complexos de uma língua mais antiga que
o pacote Windows que estávamos assimilando: programação
COBOL. Marcão era um gênio e eu apenas mais um dos
deslumbrados com a inclusão digital.
Acompanhávamos
com grande entusiasmo as novas atualizações da companhia do Bill
Gates, flertávamos com Linux (por ser underground,
libertário, a antítese da computação capitalista). Acreditava que
o final dessa evolução, após tantas transformações em
pouquíssimo tempo, era o computador portátil, o laptop. Uma maleta
que se transformava numa máquina de escrever com uma tela fina. Em
que se poderia trabalhar em qualquer lugar, levar consigo seus
softwares, suas músicas, tudo. O ápice da informática.
O
negócio não parou poraí. Os telefones celulares foram ficando cada
vez mais populares a medida que ganhavam mais transístores e o
acesso à internet melhorava. São os smartphones ou
"telefones inteligentes".
Pois
foi mexendo hoje de manhã no meu telemóvel (que não é o
melhor, muito menos iPhone) que descobri que o Youtube
é + um aplicativo pré-instalado em seu sistema operacional. Ao
logar com minha conta do Grande Irmão Google ele me
apresentou, em forma de playlist, todos os videoclipes que
curti ao longo de toda minha vida on-line. Fantástico.
Coloquei em modo aleatório e apertei o play.
Olha
o que rolou:
"Say
That" do Toro Y Moi. Comecei a ouvir esse maluquinho pq ele
se parece DE MA IS com o Megarom, um amigo que, por mais uma
coincidência, tb é artista da música. Acabei gostando dos
trabalhos dele e acompanho.
"Her
Ghost in The Fog, Live" do Cradle of Filth. A gente
levava várias madrugadas pra baixar as coisas no tempo da internet
discada. "Her Ghost in The Fog", o clipe original,
foi proibido na maioria das MTVs do mundo. Heavy Metal
supostamente satânico com pitadas de gótico. E é claro que a gente
queria saber do que se tratava!!
"Fricote"
do Art Popular. "Você é meu amor/Te quero de novo/Te ensino a
fricotar/Fricote do fofo/Eu vou te lambuzar/De água-de-coco/Bumbum
pa ti cumbum/Fricote do fofo". Como que quem nunca foi a show
algum, não comprou o disco, não ouviu em casa e, mesmo assim, sabe
a letra?
RÁ!
Entre um clipe e outro, uma propaganda de Curso de Hebraico. Como
eles podem saber que essas coisas podem me interessar? A coisa mais
bacana do mundo on-line é justamente o maior perigo:
algoritmos espiões sobre tudo o que você escreve, lê e
compartilha. Pra gerar a navegação mais individualizada possível.
E também para criar um perfil de quem talvez você não seja (por
exemplo: se eu passo horas lendo textos sobre islamismo não quer
dizer que eu seja muçulmano. Ou que queira explodir alguma coisa -
são conclusões precipitadas que não tem a ver com a religião que
é bela como todas são. Mas os algoritmos, o FBI ou a ABIN tiram
suas próprias conclusões...)
Segue
a lista:
Solo
Concert Tokyo 1984 - Keith Jarrett. Cara, esse cara faz
umas caras muito engraçadas quando está tocando sua belíssima
melodia no piano. Faz as caras que a gente faz quando tá transando.
Ou seja, só se pode imaginar que a música pra ele é um ato de
amor. É profundo, é dinâmico, é sentimento e são encantadas
composições. Respeito e admiro.
"Give
It Away" do Red Hot Chili Peppers. Esse foi o
primeiro videoclipe que ví na MTV brasileira, recém inaugurada,
sinal aberto em UHF lá no Rio de Janeiro. Um tapa na cara: aqueles
caras super enérgicos, pintados de prata, dançando vestidos de
entidades(?) em um deserto de solidão e calor. Letra anarquista, com
versos tão truncados quanto é nossa (in)capacidade de interpretar
arte inédita. Morávamos no Complexo do Alemão e quando tocava na
TV largávamos o que que fosse que estivéssemos fazendo pra ver mais
uma vez o clip daqueles doidos. O máximo de interatividade era o
programa do Cazé, o Teleguiado MTV. Não tínhamos telefone então o
que podíamos fazer era torcer pra que alguém pedisse "Give
It Away". E hoje é diferente. Hoje a gente tem acesso a
qualquer conteúdo. Na mão com um ou dois cliques. :-)
Deveria
falar alguma coisa sobre os Tablets. Foram um salto maravilhoso
também. Mas eles merecem um texto a parte.
:-)
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